quinta-feira, 30 de julho de 2009

Grande homenagem ao rei do baião

Discípulos de Luiz Gonzaga, como Elba Ramalho, Dominguinhos e Alceu Valença, apresentaram-se no Vale do Anhangabaú

No dia 2 de agosto fará 20 anos que o Brasil perdeu um de seus maiores artistas populares: Luiz Gonzaga (1912-1989), o rei do baião, o homem que carregou a bandeira do agreste no fole de sua incomparável sanfona, na voz da seca, poderosa e comovente, nas canções que se tornaram hinos da nação nordestina. Um grande evento musical no Vale do Anhangabaú reuniu discípulos do mestre, como Dominguinhos, Alceu Valença, Elba Ramalho, Oswaldinho do Acordeon e vários outros prestando homenagem a ele.

Além desses, se apresentaram outros grupos e artistas nordestinos, como Antônio Nóbrega, Cordel do Fogo Encantado, Banda de Pífanos de Caruaru, Orquestra Popular de Recife, Trio Virgulino e a Família Gonzaga. Além dos shows musicais, que incluiu grupos de maracatu e duplas de emboladores, como Caju e Castanha, o evento teve espetáculos teatrais e circenses, barracas com comidas típicas e artesanato de cada Estado do Nordeste.

O legado de Mestre Lua, de vida e obra que se confundem, é imensurável não só para os artistas e a população nordestina. Não há festa de São João sem seus baiões, xotes, xaxados e quadrilhas. Como diz Elba, qualquer coisa relacionada a esses ritmos do forró provém dele.

Nos shows, os cantores e músicos vão mesclar repertório próprio e clássicos de Gonzagão que gravaram ao longo da carreira. Elba e Dominguinhos já dedicaram discos inteiros ao mestre e lembram de sua ligação com ele. "A homenagem é mais simbólica, vai da memória, do coração, da lembrança afetiva que a gente tem dele e de toda influência que ele tem em nosso trabalho", diz Elba.

"Tive a honra de estar perto dele, de ter o carinho dele e a ratificação em relação à minha pessoa, no sentido de levar adiante o que ele tinha semeado", lembra a cantora. "A obra de Gonzaga é muito rica e surpreendente. Cezinha, que hoje é meu namorado, é um grande sanfoneiro. E ele diz que Gonzaga já tinha todos os elementos: o que ele fazia no acordeom poucos sanfoneiros no Brasil conseguem fazer." Dominguinhos concorda: "Além de cantar muito bem - tinha um peito muito forte, de aboiador -, era um sanfoneiro extraordinário."

A paraibana Elba frisa que, "além da voz linda e das qualidades como compositor, era um grande instrumentista e um músico extraordinário", que começou compondo valsas e choros instrumentais até virar a mesa com a invenção do baião. "Até hoje, em algumas músicas a gente raramente mexe nos arranjos que ele fez nos anos 50 e 60. Ele já vinha com tudo completo, com muito bom gosto e muito moderno." Um exemplo é a gravação dele para O Fole Roncou, que tem 60 anos, e até hoje não precisa que se altere o arranjo. "Era um artista completo."

Dominguinhos deve o início de carreira ao incentivo que recebeu dele. "Gonzaga foi meu segundo pai. Quando cheguei no Rio de Janeiro em 1954, com meu pai, fomos atrás dele, que me deu uma sanfoninha de 80 baixos", lembra. "Pronto, aí não saí mais do mocotó dele. Ia todo dia pra casa dele, via os ensaios, ia às gravações, e fui aprendendo com ele", conta.

Conterrâneo do ícone pernambucano, Dominguinhos é um dos muitos que não conseguem ouvir sem chorar A Triste Partida - saga das mais emocionantes sobre os retirantes flagelados da seca, escrita pelo poeta Patativa do Assaré e que Gonzaga popularizou. Esse poema é para ele um dos marcos da carreira de Gonzagão. "Ele era uma figura extraordinária. Dentro da nossa estrutura musical nordestina, foi a pessoa quem mais chegou perto de mudar as coisas", observa. "Era como um deputado, que gostava de seu lugar e ficava reivindicando melhorias aos governantes. Músicas como Vozes da Seca fizeram com que os políticos olhassem um pouco para o Nordeste."

Pernambucano do Recife, Antônio Nóbrega é de outra escola musical. "Diferentemente de Elba e Dominguinhos, cheguei a Luiz Gonzaga não como cantor, mas como instrumentista do Quinteto Armorial. Gravamos até uma versão de Algodão. Só depois é que vim me afeiçoar à música dele interpretando como cantor, a partir da década de 80", lembra. "Mas apesar das diferenças e das leituras que a gente possa fazer de sua obra, é fundamental reconhecer que ele é fundador desse gênero. Antes de Gonzaga a música nordestina era uma, depois passou a ser outra, pela importância capital da obra dele."

E, sendo do Recife, Nóbrega conviveu desde cedo com seus clássicos nas festas juninas. "São João sem Luiz Gonzaga não dá aderência", diz. Asa Branca, seu clássico mais evidente, é um dos hinos nacionais. Outros como Xote das Meninas, Assum Preto, Respeita Januário, Sabiá e muitos mais, atravessam gerações e agora ecoaram no Anhangabaú.

Fonte: Estado de São Paulo/ Texto de Lauro Lisboa Garcia adaptado por Gabriel Lima

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